Na semana passada, uma adolescente indiana de treze
anos morreu após ficar a base de água por sessenta e oito dias numa comunidade
jainista (uma das inúmeras religiões professadas na Índia) da cidade de
Hyderabad. Organizações de direitos
humanos acusaram os pais da jovem de força-la, pelo segundo ano consecutivo, ao
ritual do jejum, considerando a morte um assassinato planejado e cruel. Os pais,
por sua vez, em entrevista à rede britânica BBC, disseram que tentaram
interromper o suplício da filha após cinquenta e oito dias sem ingerir qualquer
alimento. O jejum era “voluntário”, ninguém forçou a barra.
É claro que foi assassinato planejado, ainda que
involuntário. Homicídio culposo. Que história é essa de que os pais tentaram
interromper a loucura da filha e não conseguiram? Uma adolescente de treze não
tem direito a querer se suicidar com a complacência dos pais. Esperasse a idade
considerada adulta para cometer a idiotice de morrer de fome conscientemente.
Tá difícil de convencê-la? Chama a polícia. Chama a assistência social. Chama o
Gandhi.
Ah, mas temos de respeitar a crença das pessoas...
Eis o problema do multiculturalismo, do politicamente
correto.
O respeito se resume, a meu ver, à outorga que damos aos
outros indivíduos de pensarem e se comportarem diferentemente daquilo que
pensamos e como nos comportamos. Isto não significa, absolutamente, a aceitação
passiva, acrítica, daquilo com o que não concordamos. O conflito de valores, de
visões de mundo, é um dos fundamentos da sociedade contemporânea. Respeita-se o
direito à existência do diferente, algo muito distinto de considerar correta a
forma que o diferente se comporta e organiza seu modo de vida. E tudo isto
enquanto os comportamentos e as ideias dos outros não implicarem no sofrimento
de terceiros porque, a partir de então, a diversidade cultural deixa de ser
questão de política e passa para o âmbito da polícia.
Ah, mas assim você ofende quem acredita naquilo que
acredita...
Lamento. Eu também me ofendo com um monte de coisa que
ouço e que vejo. Esta tragédia indiana, por exemplo. A vitória do obscurantismo
religioso (tautologia) nas eleições para prefeito do Rio de Janeiro também. A
clitoridectomia compulsória também. Azar o meu. Cabe a mim combater com
argumentos, ideias, ironia e sarcasmo meus inimigos intelectuais.
Tudo em nome do respeito à diversidade cultural?
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