No
dia 5 de novembro de 2009, o Ministério da Cultura constituiu através da
publicação da Portaria nº. 98, o Observatório dos Editais e o Grupo de Trabalho
Permanente do Observatório dos Editais, instância responsável pela “divulgação,
monitoramento, regulação e articulação das políticas de seleção pública de
projetos e iniciativas culturais, no âmbito do Ministério da Cultura e suas
fundações e autarquias vinculadas”. Tanto o Observatório quanto o Grupo
Permanente tinham como objetivo o aprimoramento da política de editais do MinC,
atuando na gestão da informação relativa a seleções públicas, compartilhando
experiências de processos seletivos dos órgãos e elaborando recomendações para
subsidiar a formulação de políticas de seleção pública.
Dentre
as incumbências do Grupo de Trabalho Permanente do Observatório dos Editais
estão, de acordo com o artigo 4º da Portaria nº 98, os seguintes:
I
– definir procedimentos de gestão da informação relacionada a editais de
seleção pública de projetos e iniciativas culturais, inclusive no que tange a
desenvolvimento e manutenção de sistemas, sítios e aplicativos do MinC;
II
– subsidiar a Comissão do Fundo Nacional de Cultura na elaboração de diretrizes
e prioridades para a política de editais;
III
– apoiar e orientar a elaboração e implantação de instrumentos normativos para
a regulação das seleções públicas e;
IV
– criar instrumentos de acompanhamento, monitoramento e avaliação das seleções
públicas.
O
Observatório dos Editais publicou e disponibilizou no sítio do MinC o Guia de
Políticas Culturais para Órgãos Públicos, Empresas e Instituições com o
subtítulo “Como fazer uma seleção pública de projetos e iniciativas culturais”.
Inicialmente, define-se a seleção pública como “um instrumento de escolha dos
melhores projetos e iniciativas para promover o desenvolvimento econômico,
social e cultural de uma população específica”, servindo, no caso da área
cultural, como diálogo com a sociedade civil pelo que se toma conhecimento das
iniciativas e ações culturais que existem, oferecendo “espaço para novas ideias
e propostas, estimulando assim a criatividade, a diversidade e o protagonismo
dos agentes culturais”. Tende, também, a ter grande repercussão na sociedade,
possibilitando a “descentralização dos investimentos” por conta do grande
número de inscrições.
O
Guia também lista vinte e uma etapas do processo de seleção pública, dentre as
quais, algumas dispensáveis dependendo da maior ou menor complexidade da
proposta. Pedindo licença aos leitores, realço quatro delas, indispensáveis em
toda e qualquer modalidade. A primeira delas é exatamente a etapa 1,
“diagnóstico das demandas da área cultural”, detalhada como se segue:
O
segmento de uma seleção pública depende do planejamento das ações e da escolha
de estratégias adequadas. Para isso, deve-se buscar compreender as dinâmicas
das manifestações culturais da região, com especial atenção às dificuldades
encontradas pelos agentes culturais. É preciso diagnosticar os segmentos que
mais necessitam de apoio, bem como as potencialidades presentes no campo
cultural que precisam de estímulo para se desenvolver e se consolidar. A partir
desse estudo, deve-se escolher as áreas estratégicas para democratizar o acesso
à cultura e para fortalecer as expressões artísticas e culturais.
Por
sua vez, a etapa 4, “lançamento e divulgação do regulamento” afirma que:
A
divulgação do regulamento da seleção pública é imprescindível para que haja um
bom número de inscritos. Além da disponibilização do regulamento, é importante
divulgar a seleção em eventos públicos, na imprensa, nas redes de instituições
culturais e nas rádios.
A
etapa 5, “recebimento das inscrições”, diz que:
Durante
o período de inscrições, recomenda-se a realização de oficinas de capacitação
de proponentes, para divulgar a seleção e aumentar o número e a qualidade das
inscrições. Essas oficinas de capacitação devem ser realizadas,
preferencialmente, com os segmentos e nas regiões que geralmente não têm grande
participação nesses processos seletivos.
Finalmente,
a etapa 21, “avaliação da seleção pública”:
Ao
final de todo o processo da seleção pública, e após a realização dos projetos,
ações e aplicação das premiações, a instituição que promoveu a seleção pública
deve analisar os resultados e avaliar se os objetivos iniciais foram alcançados.
Deve ser realizada uma reflexão sobre os pontos positivos e negativos, e podem
ser levantadas sugestões de mudanças para as próximas seleções públicas.
Alguns
meses antes, o MinC já havia publicado a Portaria nº. 29, de 21 de maio de
2009, que dispunha sobre “a elaboração e gestão dos editais de seleção pública
para apoio a projetos culturais e para concessão de prêmios a iniciativas
culturais no âmbito do Ministério da Cultura”, em cujo anexo constava o Manual
de Orientação para Elaboração e Gestão de Editais de Seleção Pública de
Projetos e Iniciativas Culturais. Além dos princípios que devem reger as
seleções públicas (transparência, isonomia, legalidade, moralidade,
impessoalidade, publicidade, eficiência, equilíbrio regional, acesso à
inscrição), verifica-se a existência de uma etapa a mais na sua elaboração: a
justificativa do valor estipulado para o apoio ou prêmio.
A
criação do Observatório dos Editais deve ser saudada por todos os gestores
públicos ligados à cultura porque toma para si a tarefa de, acima de interesses políticos e de ocasião,
pensar todo o processo de elaboração das políticas públicas de cultura, desde a
concepção da seleção pública até o momento de sua avaliação. Obviamente que o
fato de haver uma instância responsável especificamente pela gestão dos editais
do MinC não imiscui a responsabilidade das entidades vinculadas, executoras dos
editais, de cumprir com as etapas detalhadas acima, conforme o Manual. A
avaliação, por exemplo, deve ser feita tanto internamente à instituição
responsável por um edital específico, quanto pelo Grupo Permanente, do qual
esta mesma instituição se faz presente com a indicação de um representante.
As
etapas de elaboração de uma seleção pública estão interligadas, são
interdependentes. O diagnóstico da demanda (causa) é condição primeira para a
elaboração de ações que objetivem a transformação de uma realidade considerada
problemática (efeito), permitindo idealmente a aplicação eficiente de recursos
a partir de estudos que permitam a definição de um valor condizente com a
realidade socioeconômica de cada região beneficiada pela ação, bem como sua
descentralização. Podemos dizer que este ciclo resume, grosso modo, o que é uma
política cultural: diretrizes e ações elaboradas a partir de um diagnóstico da
realidade sobre a qual se quer atuar. Tanto mais eficiente quanto melhor a
divulgação das ações, conforme a etapa 4 do Guia, e o desenvolvimento de
sistemas e aplicativos de gestão de informação. Não é mais possível gerir
editais a partir de planilhas em Excel...
Passados
mais de três anos da publicação das duas Portarias Ministeriais, podemos fazer
as seguintes perguntas ao Ministério da Cultura e suas entidades vinculadas:
1. Seus
editais são geridos através de sistemas online?
2. As
áreas diagnosticam a demanda, público-alvo do Edital?
3. As
áreas avaliam o resultado do Edital, no sentido de aprimorá-lo?
4. Há
pessoal designado especificamente para a gestão dos Editais?
5. Há
estudos internos e/ou externos que justifiquem a dotação de valores de prêmios
e bolsas?
6. Como
é realizada a divulgação dos Editais?
7. Há
capacitação da demanda no que se refere à elaboração qualificada de projetos
concorrentes?
8. Os
relatórios de gestão são publicados, de acordo com as diretrizes da Lei de
Acesso à Informação?
As
respostas às questões levantadas acima são de fundamental importância se não
queremos que os editais de seleção pública transformem-se num fim em si mesmo,
um ato meramente burocrático, com começo, meio e fim. O fim de um edital, na
realidade, deve ser entendido como o início de um novo processo, a elaboração
do edital seguinte, com ou sem modificações. A necessidade ou não de
modificações só será confirmada depois da avaliação. Novamente nos vimos diante
daquele ciclo virtuoso: elaboração, aplicação, monitoramento, avaliação.
Aparentemente,
o Observatório dos Editais e o Grupo Permanente permanecem (desculpem-me a
redundância) ativos somente no papel. Pelo menos é esta impressão que se tem
quando acessamos o site do Ministério da Cultura. Nele, não há qualquer
referência à sua existência e, depois de bastante procurá-lo, descobre-se que
houve a publicação de um Relatório Anual referente ao ano de 2008 – Seleções
Públicas do Sistema MinC – e que a última notícia publicada é datada do dia 24
de outubro de 2011, ou seja, há mais de um ano. Caso a impressão esteja
correta, tenho apenas que lamentar e rogar aos atuais dirigentes do Ministério
da Cultura que revitalizem uma instância que só tem a ajudar no aprimoramento
das políticas públicas de cultura, tornando-as cada vez mais eficientes,
democráticas e dignas dos recursos orçamentários, ainda que parcos.
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