Passava
um pouco das onze horas da manhã. Seguíamos para o Aeroporto Internacional de
Los Angeles para iniciarmos a longa jornada de volta ao Rio de Janeiro depois
de duas semanas de visita a parentes e diversão nos parques da Disneylândia, neste
último caso, sobretudo para meu filho de quatro anos. A poucos metros do
destino, recebemos um telefonema de meu pai que, a milhares de quilômetros dali,
graças às maravilhas da globalização da informação, via, na tela da televisão
de sua casa, que um maluco resolveu disparar a esmo com um rifle em pleno
terminal 3 do aeroporto. A princípio, minha tia, que recebeu a ligação, achou
que era uma brincadeira do irmão, mas não era. Quase instantaneamente, vimos
carros da polícia e do esquadrão anti-bomba passar pelo nosso carro em alta
velocidade e muitos outros, de civis, vindo na contramão, uma vez que as vias
de acesso ao aeroporto haviam sido bloqueadas. Até segunda ordem, todos os voos
estavam cancelados. Soubemos, depois, que foram cerca de setecentos
cancelamentos e mais de setenta mil passageiros prejudicados.
O que
fazer? Eu tinha de voltar ao Rio de Janeiro naquele dia, sexta-feira, chegando
aqui no sábado pela manhã, porque tinha compromisso inadiável no domingo. Bateu
aquela angústia, é claro. O namorado de minha tia teve, então, uma sacada
genial. Voltamos para casa, a alguns quilômetros do aeroporto, e começamos a
ligar para a companhia aérea tentando remarcar nosso voo para Houston, de onde
partiria a conexão para o Rio de Janeiro, a partir de algum outro aeroporto nas
redondezas de Los Angeles. Havia três opções: Long Beach, Santa Ana e Ontário. Obviamente,
os atendentes estavam todos ocupados e o tempo de espera era de quinze minutos.
Usamos dois telefones. Num tempo menor do que o previsto, a ligação foi completada
e a atendente ficou de realizar a reserva para o aeroporto de Santa Ana, distante
a uma hora de onde estávamos, retornando em alguns minutos para a confirmação. A
única saída era essa, porque o voo partindo de Santa Ana chegaria a Houston a
tempo de pegarmos a conexão para o Rio de Janeiro. Se não houvesse mais
assentos disponíveis, só poderíamos retornar para casa no dia seguinte.
Resolvemos
sair de casa e pegar uma das freeways que cortam a cidade de Los Angeles, mesmo
sem a confirmação da reserva. A atendente não retornou, mas, numa nova ligação,
toda ela respondida eletronicamente, soubemos que estava tudo encaminhado. Para
ajudar, um aplicativo do IPhone atualizava as condições do tráfego e possíveis
rotas de fuga. A combinação de um bom “gestor de crise” com um sistema de
telefonia celular inteligente e vias de acesso de excelente qualidade nos
permitiram chegar ao aeroporto John Wayne a tempo de realizar o check-in com
tranquilidade e ainda comer um sanduíche antes do embarque. O aeroporto, bem…
De pequeno porte, conforme meus parentes informaram, dão um banho em qualquer
aeroporto tupiniquim, mesmo aqueles “internacionais”: arejado, claro, limpo, com
boa oferta de serviços, WiFi, funcionários educados, banheiros limpos, funcional.
Resumo: em uma hora, fomos do inferno ao céu.
Chegando
ao Rio de Janeiro, um choque de anti-civilização. Exceção feita à rapidez da
checagem de passaportes brasileiros, todo o resto é de envergonhar qualquer
nativo que pretenda receber bem o estrangeiro. Calor intenso, estética
deprimente, péssima sinalização, escadas rolantes em mal estado de
funcionamento, taxistas berrando em busca de passageiros como se estivéssemos
num leilão, preços extorsivos cobrados pelas cooperativas de táxi (cerca de 50
dólares para o percurso aeroporto-zona sul da cidade). Que boas-vindas!
Fico
imaginando se o tiroteio no terminal 3 do Aeroporto de Los Angeles tivesse
ocorrido num dos terminais do Aeroporto Internacional do Rio de Janeiro. O
sistema de telefonia celular funcionaria? As vias de acesso ao/do Aeroporto, no
bairro da Ilha do Governador, dariam conta do fluxo de veículos buscando a
única saída possível, ou seja, o Aeroporto Santos Dumont, no Centro da cidade? As
companhias aéreas estariam preparadas para lidar com situações de emergência?
A
resposta é clara: NÃO. As ligações feitas a partir da telefonia móvel, além de
serem uma das mais caras do mundo (de Houston para o Rio de Janeiro, uma
ligação de telefone público custa US$ 1 por dois minutos), rotineiramente ficam
pelo meio do caminho, a malha viária da capital fluminense está saturada e
engarrafamentos acontecem a qualquer hora do dia ou da noite, mobilidade urbana
é apenas um sonho distante.
É claro
que o episódio do tiroteio, praticamente um traço cultural do povo norte-americano
tanto quanto a nossa decantada malandragem, causou transtornos enormes a
milhares de pessoas e, para quem não estava acompanhado de residentes da cidade,
como era o nosso caso, voltar para casa foi um martírio. No entanto, para além
deste caso em particular, é chocante a forma como o cidadão comum norte-americano,
alheio à política internacional do governo, da espionagem, das guerras sujas
contra povos soberanos, o cidadão comum que sai para trabalhar todo dia e que
paga seus altos impostos, é tratado pelo poder público. Mesmo numa megalópole
como Los Angeles, as ruas são limpas e bem sinalizadas, o transporte público, apesar
de praticamente todo morador da cidade ter um carro, é moderno, serviços de
telefonia e Internet funcionam ininterruptamente, os parques para as crianças
estão em perfeito estado, há bebedouros disponíveis para quem tem sede, respeita-se
os sinais de trânsito e os pedestres, a sensação de segurança é plena.
Enquanto
aqui… Imagina na Copa!
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