No final de 2012, o Fórum da Cultura, que congrega as
associações de servidores da Funarte, Biblioteca Nacional, IPHAN, IBRAM e do
próprio MinC, encaminhou carta à então ministra da cultura, Marta Suplicy,
denunciando as péssimas condições de trabalho no Palácio Gustavo Capanema,
ícone da arquitetura moderna com seus brise-soleil, o pilotis e os murais de
Portinari. Nela, pondera-se que a saúde dos funcionários é comprometida pela
falta de ar-condicionado, especialmente numa época do ano em que, na cidade do
Rio de Janeiro, as temperaturas ultrapassam, facilmente, os quarenta graus à
sombra. Eram frequentes, então, os casos de mal-estar e problemas relacionados
à pressão arterial, cuja solução já vinha sendo demandada, segundo a carta do
Fórum, desde o ano de 2009, sem êxito junto às autoridades competentes. Noves
fora a irrelevância da saúde de quem trabalha no Capanema, se for este o caso, poder-se-ia
(a mesóclise está na moda), ao menos, pensar nos frequentadores ocasionais que
precisam dos serviços das instituições que ali funcionam cuja qualidade é
prejudicada se quem deve estar no outro lado do balcão não está por motivos
alheios à sua vontade.
Reforçando as reivindicações do Fórum da Cultura, o
jornal O Globo publicou matéria intitulada “Cultura do calor” no dia seguinte
em que a carta foi entregue a então ministra da cultura. Na matéria, ficamos
sabendo que o Palácio Gustavo Capanema não possuía, até então, refrigeração
central e que, numa linda manhã de verão, um termômetro comprado por servidores
registrou 44°C, um dia após a cidade do Rio de Janeiro registrar seu recorde
histórico de calor. Ventiladores têm de ser espalhados pelos ambientes o que,
via de regra, pouco ajudam, uma vez que apenas fazem o ar quente circular. O
MinC emitiu nota, informando que, em 2013, iniciaria obras para a restauração
total do Palácio Gustavo Capanema, incluindo-se, no projeto, o sistema de
ar-refrigerado independente “para diversos ambientes”, e o resgate de condições
previstas no projeto original para a adequada ventilação, como o sistema de
basculantes brise-soleil, “persianas e abertura superior das janelas para
ventilação”.
Detalhe: alguns “ambientes” já dispõem de refrigeração.
Por uma questão de empatia, seria de bom tom desligar o equipamento numa
manifestação de solidariedade com os demais colegas de trabalho. Como num
casamento, na alegria e na tristeza... Ou será que uns suam mais que outros,
sentem mais calor que outros, sofrem mais que outros? Luta de classes numa hora
dessas? Manda quem pode, obedece quem tem juízo?
Desde então, o que mudou nas condições de trabalho dos
servidores?
Nada. Ou melhor, piorou.
Sem verba para a transferência temporária dos
funcionários a um equipamento dotado de infraestrutura mínima de trabalho, uma
das sugestões encaminhadas pelo Fórum da Cultura, o MinC iniciou a restauração
do Palácio Gustavo Capanema com o corpo de servidores in loco, cumprindo inclusive com uma das informações na tal nota
emitida após a divulgação da matéria d’O Globo, de que as obras seriam feitas
em várias frentes para evitar a paralisação das atividades.
Imaginem vocês, portanto, ter de trabalhar num prédio
lacrado. Sim, porque as janelas devem ficar fechadas permanentemente de modo a
evitar contato com a poeira e o cheiro de material químico usado pelos operários,
não só nos meses agradabilíssimos do outono e inverno, quando as temperaturas
estacionam em torno de trinta graus, mas ao longo dos infernais meses novembro,
dezembro, janeiro, fevereiro... Um autêntico forno micro-ondas. E o lacre, por
não ser perfeito, não impediu e continua não impedindo que funcionários passem
mal e setores inteiros tenham de encerrar as atividades do dia por causa de
tonturas, garganta irritada, olhos ardendo o que, por outro lado e pensando
bem, ajudou ao combalido setor de serviços da economia brasileira, afinal,
cresceu a procura por otorrinolaringologistas, oftalmologistas e pneumologistas.
A situação do Palácio Gustavo Capanema, hoje (não interessa
a promessa de 2013, seguro morreu de velho), cai como uma luva no ditado
popular “por fora, bela viola; por dentro, pão bolorento”. De que adianta a
bela vista que os funcionários têm dos andares mais altos, dos aviões decolando
e pousando no aeroporto Santos Dumont, de Niterói, dos barquinhos passeando
pela Baía de Guanabara, se as condições de trabalho são degradantes? Por que não pleitear adicional de
insalubridade por se tratar de atividade que envolve risco à integridade física?
Como realizar qualquer tipo de trabalho intelectual com o suor pingando do
rosto em cima da papelada, com o calor queimando os miolos? Medidas paliativas,
como o uso de bermudas para os homens, durante os três meses do verão, e a
racionalização dos turnos e jornada de trabalho são suficientes (esta última,
também sugerida pelo Fórum da Cultura)?
É inacreditável que, em pleno ano de 2016, um órgão do
governo federal seja obrigado a estabelecer escalas de trabalho para seus
funcionários por força de eventos climáticos perfeitamente controláveis. Se
estabelecermos uma relação entre este estado de calamidade com a recente
extinção e ressuscitação do MinC, percebemos o quanto a Cultura é
(des)valorizada em nosso país, entra governo, sai governo, golpista ou não.
Link:
http://associacaodeservidoresdafunarte.blogspot.com.br/2013/01/cultura-no-calor-infernal-do-capanema-e.html
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