Se o mosquito
do ateísmo, do materialismo, da descrença em crenças religiosas, não me
houvesse picado há vários anos, diria que, em outra vida, teria nascido
argentino. Não é novidade para quem me conhece um pouquinho que sou tarado
incurável por nossos vizinhos, sobretudo os portenhos, seu sotaque, sua comida,
sua arquitetura, sua personalidade, sua beleza, sue inverno gelado, seus
vinhos, seu acerto de contas com a história condenando os açougueiros de
coturno. Certa vez, alguém me disse que precisava ir, pelo menos, uma vez ao
ano a Buenos Aires para renovar as energias. Este é o meu caso.
Ontem, fiquei
dividido. “Cago baldes” para o discurso nacional-futebolista que nos obriga a
venerar a seleção brasileira. Ela não representa o país, ela não é a “pátria de
chuteiras”; eles, os jogadores, representam a si mesmos e, muitos, ao levantar
as mãos pros céus quando comemoram um gol, são a anti-representação do que entendo
por nação. Mas, não posso negar, aprendemos, desde pequeno, a cultivar o amor
pela amarelinha, a reproduzir a tradição inventada em 1958 desde que Bellini
ergueu a Jules Rimet, a contar histórias dos nossos ídolos clubísticos. Pelé é
melhor que Maradona. Zico é melhor que Dinamite. Futebol é diversão, e só.
Liguei a
televisão no único canal aberto que transmitia a partida, a TV Globo. Disso,
não podia fugir. No entanto, o controle remoto permite retirar o volume, o que
fiz prontamente, aliviando-me do prazer masoquista que milhões de brasileiros
sentem com a locução galvanista, ufanista. Sintonizei na Rádio Mitre, de Buenos
Aires. Uma delícia de transmissão direta do “Mineirao” (sim, sem o til), relato
no tom certo, nada esquizofrênico (um minuto são deuses e, no seguinte,
diabos), reconhecedores da superioridade brasileira, críticos da atuação dos
compatriotas e do técnico, as frases e expressões poéticas do castelhano
portenho que resumo numa só: “selección (argentina) papelonera”.
Messi e Neymar
podiam ter combinado um empate no jatinho que os trouxe da Europa. Dormiria
mais feliz. 3 a 0 foi demais.
Fonte da foto:
http://www.futebolportenho.com.br/2011/07/16/argentino-deixa-rivalidade-de-lado-e-cria-camisa-argento-brasileira/
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