Baixada a poeira histérica, do corre-corre da
população carioca aos postos de saúde em busca da imunização contra a febre
amarela, doença há muito defenestrada do mundo civilizado (tirem suas
conclusões), pais zelosos e responsáveis que somos, pegamos Miguel pela mão e
seguimos rumo à picada. Tentando convencê-lo da banalidade do ato, peguei a
caderneta de vacinação do pimpolho e, com ele, contamos quantas já lhe haviam
sido aplicadas, nada menos do que quarenta e nove. A da febre amarela seria a
quinquagésima. Meia centena! Nesta conta estão incluídas as vacinas
obrigatórias do calendário oficial do Ministério da Saúde e aquelas disponíveis
apenas na rede privada, portanto, pagas, a saúde de uns vale mais do que a
saúde de outros, viva o Brasil.
Já na fila, Miguel pergunta:
- Papai, a vacina é de graça?
- Sim, filho. A vacina é de graça. Você se lembra
daquela estória dos impostos, aquele dinheiro que a gente dá ao governo e que o
governo tem de devolver na forma de saúde e educação? A vacina de graça faz
parte do retorno do dinheiro que nós demos ao governo (ou seja, a vacina não é
de graça, penso eu agora). Infelizmente, muitíssimas vezes, não há vacinas suficientes
porque o governo pega o nosso dinheiro e usa para outras coisas.
- Então até os mendigos podem tomar a vacina da febre
amarela?
- Claro. Se eles souberem que estão vacinando a
população contra a doença, sim, eles podem.
- É que eu vi um mendigo ali na frente do posto, achei
que ele ia entrar na fila, mas não, ele estava só pegando alguma coisa do lixo.
- Então, filho. A questão é que os mendigos
dificilmente sabem da campanha porque a sociedade não liga para eles.
- Eu ligo.
Lição de cidadania na veia.
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