Miguel e a ecochata

- Papai, a praça é pública, não é?

- Sim, meu filho, é pública. Por quê?

- Porque aquela velha fica dizendo que a gente não pode subir na árvore.

- Pode sim. Vai lá, não liga pro que ela diz, não. Vai brincar, meu filho.

Passam-se dois minutos.

- Papai, ela continua dizendo que a gente não pode subir.

Os amigos do Miguel, constrangidos, já haviam desistido da brincadeira. Então, eu e outro pai decidimos sentar junto aos meninos, dando uma força moral diante da morta-viva. De nada adiantou, a mal-amada passou a vomitar o discurso velhaco sobre nós, de que não podiam subir naquela árvore, de que aquela árvore não aguenta o peso, de que na semana anterior uns moleques já haviam quebrado um galho, de que a árvore sente dor, de que ela foi professora por vinte e dois anos (!), de que essa (a das crianças) é a futura geração e questionando o tipo de educação que nós lhes estamos dando.

Não sou ecochato, tampouco ignoro a necessidade de respeitar e preservar a natureza. Por isso, sabia que aquela árvore não estava sofrendo com as traquinagens da molecada, não a ouvi chorar em momento algum e minha audição está em dia. Pelo contrário, estava sorrindo e orgulhosa de ser o centro da atenção de um público que, atualmente, só quer saber de jogos eletrônicos, enfurnados dentro de casa, isolados de tudo e de todos. Então, Miguel e os amigos continuaram a acariciar metaforicamente a árvore, dependurados como macaquinhos, sob as imprecações eivadas de fel da ex-professora que, ao que tudo indica, devia ser o cão chupando manga.

O modus operandi da ecochata é semelhante àquele das senhorinhas que, ao final da tarde, sentam-se nos bancos da pracinha e ameaçam furar a bola maltratada pela criançada que finge ser Messi e Neymar acaso ela resvale ou, sem querer, bata em alguma parte de seus corpos cansados e sem vontade de mais nada esperando, apenas, o chá da meia noite.  


Haja mal humor. 


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