Reza a lenda que Cosme e Damião eram dois irmãos
gêmeos que seguiram a medicina e viveram na Ásia Menor, conhecidos por curarem
pessoas e animais sem cobrar dinheiro. Morreram degolados por volta do ano 300
d.C., vítimas de uma perseguição do imperador romano Diocleciano. Eles são
considerados os padroeiros dos farmacêuticos, médicos e das faculdades de
medicina e, o que interessa aqui, protetores dos gêmeos e das crianças. Por
isso, as pessoas criaram o costume de distribuir os doces para homenageá-los ou
cumprir promessas feitas a eles. Na religião católica, o dia 26 de setembro
lembra os jovens que pregavam os ensinamentos de Jesus Cristo, é o famoso dia
de Cosme e Damião, transformados em santos.
Festas religiosas são desculpas esfarrapadas para
reunir a família e encher a pança. Nós judeus que o digam. Ou satisfazer a
sanha por glicose das crianças. Lembro-me que, menino, uma vez ao ano, e pouco
compreendia o motivo, recebia de gente que passava na rua saquinhos de papel
lotados de doces os mais variados, o saquinho pintado com as figuras de dois
santos, São Cosme e São Damião. Não era católico, mas era criança, e como o
critério de distribuição era o da idade, aproveitava para empanturrar-me de
pé-de-moleque, Maria Mole, paçoca, bananada, suspiro, balas, bombons,
pirulitos, doce de leite e chocolates de qualidade duvidosa (comprados no
atacado, quantidade em detrimento da qualidade).
Ontem, Miguel foi introduzido a mais esta tradição
gastronômica carioca. Voltando da escola, deparou-se com hordas de crianças na
pracinha em frente de casa, olhos atentos e vigilantes a qualquer movimento
suspeito de quem passasse carregando grandes sacos de supermercado. Quando o
radar indicava a presença de açúcar nas imediações, como um enxame ensandecido
a molecada cercava o alvo e, em segundos, dizimava os embrulhos, azar dos mais
fracos, a vida selvagem não é para qualquer um, não. Miguel, um lorde inglês, chegava perto e
pedia um saquinho, deu sorte. Quis voltar no final do dia quando sai a turma da
tarde da escola que fica numa das pontas da praça. Tiro e queda. Conseguiu mais
um saquinho e o dentista do Miguel, esfregando as mãos em algum lugar,
agradecendo à Igreja Católica por mais um cliente...
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