Chocolate

Não sou chocólatra, mas, de vez em quando, gosto de adoçar o bico com uma dessas gostosuras imperialistas que invadem as prateleiras dos mercados tupiniquins há alguns anos. Meus favoritos são o Twix e o KitKat. Dirão os saudosos do período da “substituição de importações” que o Bis, produto genuinamente brasileiro, é tão bom quanto os concorrentes estrangeiros e aquece a economia com geração de empregos. É, pode ser, mas o caramelo puxa-puxa do Twix me tira do sério.

Miguel sabe muito bem onde guardo as guloseimas vindas do mercado, no armário de mantimentos da cozinha. Cansei de abri-lo, em plena crise de hipoglicemia, e ficar a ver navios, apenas latas de ervilha e milho, sacos de arroz, feijão e macarrão. Cansei de dar esporro no Miguel dizendo que havia chocolate para todo mundo, que ele não podia sair comendo tudo que encontrasse pela frente apesar de não haver o nome do dono inscrito em cada um dos doces. Que era egoísmo, que ele não pensava nos outros, que ele também ficaria fulo da vida se alguém resolvesse comer o chocolate alheio, que isso e aquilo.

O último arranca-rabo foi anteontem. Alguém havia comido o “mingau” que estava ali, e eu sabia muito bem quem tinha sido e não era um certo alguém com cachinhos dourados. Novo sermão, novas ameaças de uma vida sem açúcar.

Ontem, chegando do trabalho, abro a geladeira para tomar uma cervejinha e, glorioso, um KitKat se refrescava do calor escaldante que começa a tomar conta do Rio de Janeiro pelos próximos três meses. Tiro-o dali para ganhar uma consistência mais macia. Havia deixado, pela manhã, uns trocados para que o filhote fizesse um lanche na padaria, o tradicional joelho com refresco de que tanto gosta, e eis que ele resolveu torrar a grana com um KitKat para o pai. Pagou o dobro do que pagaria no mercado, foi extorquido sem saber. Eu, idiota e insensível, racional até a raiz dos cabelos, apesar de havê-lo agradecido, disse que havia pago muito caro e que não precisava. E Miguel responde:

- Mas eu queria comprar para você.


Vou dividir com ele. Ele merece.


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