Há alguns dias, o deputado estadual mais votado do Rio
de Janeiro se referiu à Aldeia Maracanã, na zona norte da capital fluminense e
que abrigava o antigo Museu do Índio, como um “lixo urbano” e que era
necessária uma “faxina” no local para “restaurar a ordem”. Para ele, “quem gosta de índio, que vá
para a Bolívia, que, além de ser comunista, ainda é presidida por um
índio". Como carioca, causa-lhe indignação “ver aquilo do jeito que está
hoje”.
É comum a utilização de
metáforas associadas à ideia de limpeza como justificativa para o extermínio de
seres humanos. A “limpeza” étnica é, na realidade, mais do que metáfora, um
eufemismo. O mesmo pode ser dito da “faxina”, necessária para varrer o “lixo”
do ambiente. As milícias hutus que comandaram o genocídio da população tutsi,
em meados da década de noventa em Ruanda, por exemplo, estimulavam a matança
nas rádios locais porque era imprescindível “eliminar as baratas”. “Arrancar as
ervas daninhas”, “extirpar o câncer”. Higiene, assepsia, eugenia.
As declarações do deputado estadual não foram
repudiadas da forma como se esperaria numa sociedade multicultural. Talvez
estejamos diante de uma releitura do mito das três raças que ajudou a forjar a
identidade nacional, eliminando o vértice indígena, recentemente estigmatizado
como “indolente”. O próprio presidente da república eleito, reproduzindo o
estereótipo cheirando a naftalina do índio como um bárbaro que usa tanga e vive
entre animais selvagens e precisa ser resgatado pela civilização acredita que “o índio quer evoluir, quer médico, dentista,
internet, carro, viajar de avião” e que “quando [o índio] tem contato com a
civilização, vai se moldando a outra maneira de viver, que é bem melhor que a
dele”. Faz tempo que índio não quer só
apito, que índio usa celular e voa de avião, sem perder sua identidade.
Estereótipos e estigmas a serviço do evolucionismo social.
A normalização do discurso xenófobo, racista,
supremacista é preocupante. Outro dia, num churrasco, em meio a uma discussão
sobre hábitos alimentares, ouvi de um dos convidados que “eles não podem impor
os seus”, referindo-se aos imigrantes orientais - categoria generalizante
bastante questionável - e seus descendentes brasileiros que, eventualmente,
comem carnes “exóticas”, gafanhotos e outros insetos estranhos ao “nosso” paladar.
Vejam bem. O convidado utilizou o termo “eles” para referir-se, também, aos descendentes
BRASILEIROS.
Por via das dúvidas, a partir de hoje, lá em casa só
entra McDonald’s...
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