A saga do pai babá continua


Curitiba não é, exatamente, uma cidade carnavalesca. Não há tradição de desfile de escolas de samba e os blocos de rua são raríssimos. Para quem vem do Rio de Janeiro, que vive e respira Momo o ano todo, é um choque cultural. Não que eu seja um sambista de primeira hora, muito antes pelo contrário, mas me acabava nos blocos de rua espalhados pela cidade por praticamente uma semana. Meu uniforme era, e ainda é, um vestido rosa de bailarina. Mas, como diz o ditado, “em Roma, como os romanos”, então tivemos de nos adaptar à nova realidade, curtindo os dias de folia nos parques curitibanos, sorte que o sol brilhou a maior parte do tempo e pudemos fingir que a morenice da pele era consequência de horas e mais horas nas areias da praia do Leme, nossa favorita num passado não tão distante assim.

Então, na terça-feira gorda, aproveitando o bom tempo, munidos de canga, cerveja, amendoim, livros, bola e bicicleta, seguimos para o tradicional “parcão” atrás do Museu Oscar Niemeyer, ponto de encontro de todos os cachorros possíveis e imagináveis da cidade. Antes de sairmos de casa, mandamos uma mensagem aos pais de alguns amigos do colégio do nosso filho, caso estivessem em casa “de bobeira” e quisessem tomar um pouco de ar fresco. Fomos os primeiros a chegar. Pouco tempo depois, vejo lá ao longe um dos colegas chegando acompanhado do pai. Aceno. Os dois, então, iniciam um breve diálogo, em seguida o colega vem em nossa direção e o pai segue para o estacionamento.

- Oi, fulano. Tudo tranquilo?

- Tudo. Meu pai pediu para avisar que vai voltar para casa porque precisa ir ao banheiro. Ele disse que, quando vocês forem embora, é para ligar para ele, que ele vem me pegar.

- Ah, tudo bem.

Num primeiro momento, eu fiquei com cara de paspalho, atônito. Pensei com os meus botões que aquele comportamento era extremamente rude, pouco civilizado, condenável sob qualquer perspectiva, contrariando a moral e os bons costumes, a ordem e o progresso. Estávamos a uns cinquenta metros e o pai do colega não podia vir nos cumprimentar, trocar um “bom dia” e explicar a situação? Perguntar se não havia problema em deixar o filho por um tempo, ou por TODO O TEMPO inventando uma desculpa menos esfarrapada e escatológica do que a do “estou apertado”? Aliás, o Museu Oscar Niemeyer tem banheiros masculinos e são bem limpos, pelo que pude comprovar nas duas ou três vezes que precisei esvaziar a bexiga. Num segundo momento, condescendente, entendi a situação, todos nós sabemos que não há privada mais aconchegante do que de nossas casas, né. Um par de horas depois, o pai do colega me liga. Pergunta se já era hora de pegá-lo. Eu digo que eles ainda estão brincando, o pai me pede para avisá-lo quando fora o momento, então. Eu respondo “pode deixar”, querendo dizer, na verdade, “sim, senhor”.

Em menos de um mês, em duas oportunidades, assumi o papel de babá de colegas do meu filho. Coincidência ou não, em ambas, o responsável atarefado que não podia ficar no parquinho era o pai. Tendo a acreditar que, na cabeça deles, a obrigação de levar os filhos para brincar com os amigos nos finais de semana, ou de compartilhar momentos lúdicos em casa, em família, seja das mães. Além disso, por mais que esses pais não pudessem ficar conosco, o mínimo que poderiam fazer era perguntar sobre nossa disponibilidade em tomar conta de SEUS filhos. Este comportamento não depõe contra meu insólito papel de babá, obviamente, mas contra aquilo que entendemos ser o papel de pai - e mãe também.  
  
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