Até breve, Rio.

 

A primeira sensação, ao desembarcarmos no aeroporto Santos Dumont, é a do vento morno e úmido lambendo nossas caras. Imediatamente, as camisetas grudam no corpo. Fazia quase trinta graus às sete e meia da noite. Pedimos um táxi. O local de espera fica de frente para a baía de Guanabara. Outros passageiros também aguardam, e já ouvimos aquele sotaque inconfundível que não ouvíamos há mais de dois anos. O táxi chega e nos leva para Copacabana, casa dos pais e avós paternos, que não tinham a mínima ideia da surpresa prestes a acontecer. O caminho é um filme de nossa vida até 2018. Vai pelo Aterro do Flamengo, onde desfrutamos centenas de vezes a área de lazer dos finais de semana. Os prédios da praia do Flamengo, imponentes e iluminados. A Rua Paissandu e suas centenárias palmeiras. O Pão de Açúcar. O viaduto da Rua Pinheiro Machado. A torre do shopping Rio Sul e o Túnel Novo.

Em Copacabana, um mundo à parte. As mesas do lado de fora dos bares completamente cheias. Na Rua Barata Ribeiro, o táxi compete com os ônibus. Gente caminhando pelas calçadas. Vida pulsando. O táxi entra na Rua Tonelero, onde moravam meus avós maternos. Paramos num sinal na esquina da Rua República do Peru e, ao nosso lado, uma motocicleta com o motorista e a garupa, que falava ao celular numa chamada de vídeo e, novamente, o sotaque carregado. Miguel acha graça. Saltamos na Rua Hilário de Gouveia, destino final. Aqui, a estória fica para outro dia.

No sábado, logo após o café, vou correr na praia. Antes das nove da manhã, mormaço e abafado. Já há bastante movimento de banhistas. Um caos organizado. Sigo em direção ao posto 6. No trajeto, cruzo com gente com as camisetas do Flamengo, Fluminense e Vasco. Na volta, ligo para a Renata e mostro a areia e o Pão de Açúcar, que se esconde por trás dos prédios da orla. Ela chora. Estou exausto, suando desesperadamente, desacostumado com o calor carioca.

Banho tomado, pego o Miguel e vamos à Praça São Salvador, no bairro do Flamengo, um de nossos lugares no mundo. Quadrilátero mágico. Lá chegando, antigos conhecidos jogando futebol de botão. “Oi, menino!”, grita um deles, ao reconhecê-lo. Caminhamos até a lanchonete Copa 74, onde Miguel vinha sonhando com o joelho de queijo e presunto (alguns chamam de “italiano”) e refresco de caju. Quase em frente, na Rua Senador Correia, o Salão São Salvador, meus barbeiros favoritos por décadas. Sentamos na Adega da Praça, ainda vazia. Tomo uma Serra Malte gelada, o Antônio continuo por lá.

Sentamos na mureta do parquinho, usado e abusado pelo Miguel desde pequeno. Ele aponta para a árvore que era escalada junto com os amigos. De repente, uma menina fala para a mãe que aquele parquinho é “chato” e que quer ir embora dali. Miguel fica revoltado, pede para segurá-lo porque, se não, vai dar-lhe um soco. Que drama! Ficamos ali, vendo a vida passar, absorvendo as memórias tão bonitas que construímos naquele nosso cantinho.

Na guarita do edifício em que moramos por uma década, os mesmos porteiros. O André nos reconheceu, apesar das máscaras. Onde está o Jorge?, pergunto. Deu uma saída, mas já vai voltar. Entramos e sentamos um pouco num dos bancos de pedra da bonita entrada. Gente entrando e saindo. O Jorge chega, o mesmo rosto e a mesma voz imponente. Brincava com o Miguel desde bebê.

Seguimos para a Galeria Condor, no Largo do Machado. Ali, a melhor esfiha de carne do Rio de Janeiro, inigualável, na Rotisseria Sírio-Libanesa. Peço duas de carne, duas de queijo e duas de verdura “para viagem”. Miguel toma mais um refresco de caju e eu não resisto, como uma de carne em pé mesmo, ali no balcão.

Atravessamos o Largo do Machado. Passamos pela feira de sábado e pela feira de adoção de animais. Foi ali que pegamos nosso felino caçula, o Leopoldo, há mais de sete anos. Entramos na Rua do Catete, à procura da Casa do Biscoito, em busca do Skiny, um salgadinho de milho praticamente impossível de encontrarmos em Curitiba, e do Guaravita, uma bebida de guaraná que eu particularmente acho horrível, mas é adorada pelo Miguel. A Rua do Catete bastante movimentada com seus tradicionais camelôs. Entramos na Rua Silveira Martins, em direção à praia do Flamengo, margeando o Palácio do Catete, à espera do táxi que nos levaria de volta a Copacabana.

No domingo pela manhã, enquanto eu corro novamente pela orla, Miguel e os avós caminham na pista da Avenida Atlântica, transformada em área de lazer. Encontramo-nos cerca de uma hora depois. Miguel pede o “mate do tonel”, um clássico das praias cariocas. Vou com ele até a areia e ficamos esperando passar o vendedor. Passamos pela barraca da Tia Santa, meu ponto cativo na praia de Copacabana nos anos em que morei no bairro. Ele chega. Em cada ombro, um tonel. O da direita, mate; o da esquerda, limonada. Ele pergunta “meio a meio ou mais mate?”. Miguel posiciona o copo embaixo da torneirinha. “Diz quando chega”. “Chega”. Um pouco de limonada. O vendedor diz que pode tomar um gole porque ainda tem o “chorinho”, quer dizer, ele ainda dá um pouco de mate “de lambuja”. Tudo isso é muito carioca. É uma tradição imemorial. Um por seis, dois por dez. Dois por dez, é claro, porque eu também não posso deixar passar a oportunidade. Comida, memória e identidade.

No final da tarde, volto à areia para a despedida. O céu está azul e a lua cheia já desponta. Gente jogando vôlei de praia. Peço uma cerveja na barraca da Tia Santa e fico observando o movimento, imaginando quando, no futuro, poderei reviver essa parte de mim que tanto me dá prazer e felicidade.

Até breve, Rio.




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